domingo, 7 de novembro de 2010

Duas reformas políticas

Por Edison da Silva Jardim Filho

Não há ninguém, minimamente esclarecido, que não considere, depois das últimas eleições, que as instituições e as leis que visam possibilitar o funcionamento da nossa democracia, não atendem a expectativas mesmo medianas.
Mas fala-se da “reforma política” sem a constatação de que ela será inócua se não envolver também as instituições jurídicas que têm tido um papel ativo no pífio desempenho da democracia no Brasil: o Poder Judiciário, o Ministério Público e os Tribunais de Contas. De que adiantará implementar-se uma série de medidas diretamente relacionadas às eleições e aos partidos políticos, mantendo-se a dependência- vergonhosa, diga-se de passagem- de tais instituições jurídicas em face do poder político em geral?... E ninguém desconhece o que deve ser feito para dar início ao fim dessa influência corrosiva. Em relação ao Poder Judiciário, suprimindo-se o acesso às vagas de ministro e desembargador pelo processo denominado de “quinto constitucional”- quem fez a opção por ser advogado ou membro do Ministério Público, que o seja pela vida toda. Em relação ao Ministério Público Federal e Estaduais, abolindo-se a escolha do procurador-geral, respectivamente, pelo presidente da República e pelos governadores dos estados. Em relação aos Tribunais de Contas, derrogando-se a maior mistificação institucional existente hoje no país: acreditar-se que alguém que, a vida inteira, foi político profissional, possa, de uma hora para outra, transmudar-se em magistrado- isento, pois- de contas públicas, cujos ordenadores primários são os seus colegas de ontem e camaradas para todo o sempre.
Depois de ter conspurcado a instituição “presidência da República”, encurralado e desmoralizado a Justiça Eleitoral, ameaçado e debochado do Ministério Público Eleitoral, arrostado e ridicularizado os adversários políticos, cooptado, para não dizer a outra palavra mais exata, a avassaladora maioria da classe política, intimidado a imprensa, em suma, pisoteado todos os venerandos princípios, escritos e tácitos, que regiam- não se sabe se ainda regem- a democracia brasileira, o presidente Lula afirmou, na reunião ministerial ocorrida na última quinta-feira, dia 4 de novembro, que “vai atuar como um leão na reforma política”. Aproveitou a ocasião para defender a adoção do financiamento público das campanhas eleitorais, do voto em lista fechada, e da fidelidade partidária. Essa tríade de pontos já formava o eixo do anteprojeto de reforma política que ele enviou, no começo do ano passado, ao Congresso Nacional.
Essas propostas do presidente Lula compõem a receita, perfeita e acabada, para “legalizar” a ditadura das cúpulas partidárias, e criar um conduto do tamanho dos canais que servirão para a transposição do rio São Francisco, por onde escoará o dinheiro público para os bolsos de políticos corruptos.
O cerne de uma verdadeira reforma política consiste na instituição do voto distrital- preferencialmente, o puro- e de medidas legais que visem democratizar, com a máxima radicalidade possível, os partidos políticos, acompanhada das mudanças, acima mencionadas, no funcionamento do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Tribunais de Contas. Aí, até pode e deve ser acoplado o financiamento público das campanhas eleitorais. Dizem os estudiosos que o aspecto negativo do voto distrital seria o debate político ficar restrito a questões paroquiais, não repercutindo os grandes temas nacionais. Acontece que o vigente sistema proporcional de representação- antípoda do voto distrital- não consegue mais gerar, como o fazia antigamente, congressistas de grande envergadura intelectual. Daí que não seria a adoção do voto distrital que depreciaria o debate...
        Está claro que o presidente Lula não deseja a mesma reforma política pela qual a sociedade brasileira tanto anseia. O que ele quer, pelo conhecimento que se pôde adquirir dos seus reais propósitos nestes quase oito anos de governo, é moldar a legislação partidária e eleitoral aos caprichos seus e do PT, lançando mão da folgada maioria parlamentar recém-obtida.

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