sábado, 4 de setembro de 2010

“TOGAS LIMPAS”

Por Edison da Silva Jardim Filho

Li, semana passada, notícia publicada em coluna política de um jornal de Florianópolis, informando que o ministro-catarinense-do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Jorge Mussi, iria receber o título de cidadão honorário do município do Rio de Janeiro. Na mesma solenidade, outros dois ministros do STJ também seriam homenageados pela Câmara dos Vereadores daquela cidade.

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ/SC) agracia, em datas festivas, personalidades com a medalha da Ordem do Mérito Judiciário nos graus de Grande Mérito, Mérito Especial, Mérito e Insígnia. Certamente, todos os demais tribunais do país também criaram e mantém as suas comendas em graus diferentes. Em 2.004, o TJ/SC comemorou 113 anos de sua instalação no Estado. Era o seu presidente o ministro Jorge Mussi. Na sessão solene alusiva à data, receberam honrarias o então senador da República, Jorge Bornhausen, e o ex-governador do Estado, Casildo Maldaner. Também foram homenageados empresários e outros profissionais. Não me parece despiciendo que, no Brasil, os tribunais devessem contar até o infinito antes de homenagearem os políticos e um certo tipo de empresário, histórica e umbilicalmente ligado ao poder público.

A prática de dar e receber títulos honoríficos, medalhas e condecorações, pelos ministros e desembargadores de tribunais país afora, para mim, e eu creio não estar sozinho neste pensar, atenta contra a “independência” do poder judiciário (artigo 2° da Constituição Federal: “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”). Afinal, o poder judiciário não são os seus juízes?... Essa seria uma das muitas questões que, fosse a Ordem dos Advogados do Brasil também independente, deveriam estar merecendo a sua reflexão há muito tempo: se é ou não lógica e razoável a coexistência dos princípios da “harmonia” e da “independência” na cláusula constitucional: “independentes e harmônicos entre si”, em relação ao poder judiciário? A palavra: “harmonia” não é a melhor para representar o “sistema de freios e contrapesos” que perpassa e submete os três poderes, pois também serve para admitir e justificar essa e outras práticas do poder judiciário que, aparentemente, pelo menos a um juízo moral mais rígido, não seriam muito republicanas.

Outra prática que considero, igualmente, insustentável em face do princípio da “independência” do poder judiciário, embora agasalhada pelo artigo 67 da Constituição do Estado de Santa Catarina, é a de o desembargador presidente do TJ/SC substituir o governador, nas ausências conjuntas-propositais, diga-se de passagem-dos seus dois sucessores legais imediatos: o vice-governador e o presidente da Assembléia Legislativa. O presidente do TJ/SC é o terceiro na linha de sucessão do governador. A justificativa é sempre a homenagem, repentina e merecida, que, incontidamente, o governador, o seu vice e o presidente da Assembléia Legislativa desejam prestar ao presidente do TJ/SC. Mas seria, mesmo, homenagem, ou verdadeiro “presente de grego”?... Essa prática, vista sob a ótica dos interesses mesquinhos que vêm norteando, já há um bom tempo, o poder político no Brasil, deve ter por escopo o comprometimento da credibilidade do poder judiciário.

Não encontrei fecho melhor para este artigo do que a antiga lição, infelizmente de aplicação atual, de um dos brasileiros com maior autoridade intelectual e moral em todos os tempos: o jurista Roberto Lyra, contida no seu livro: “Como julgar, como defender, como acusar”: “Togas limpas não aceitam, sequer, formas sutis e, por isso, mais perigosas de corrupção. Como o poder moderador na democracia, a Justiça deve repelir as ‘cortesias’ das ‘relações públicas’, as ‘homenagens’ de títulos e medalhas. A moeda não será em espécie, mas açula o soldado da luta direta e inerme contra as ilegalidades e injustiças.”

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